Amanutenção das taxas de juros do crédito rural em relação à temporada passada, o cenário de ajuste nos níveis de rentabilidade no campo e o menor apetite por investimentos por parte de produtores derrubaram as contratações de financiamentos no primeiro mês do Plano Safra 2024/25. A situação no Rio Grande do Sul, um dos principais demandantes de empréstimos bancários do país, também influenciou o desempenho, dizem analistas.
Em julho, pequenos, médios e grandes produtores brasileiros acessaram R$ 23,1 bilhões de crédito rural, quase a metade dos R$ 44,6 bilhões concedidos no mesmo mês de 2023. O número de contratos também retraiu, de 183,2 mil para 82,8 mil, de acordo com dados do Banco Central acessados em 7 de agosto e compilados pelo Valor.
O recuo mais acentuado foi nos investimentos, que saíram de R$ 6,4 bilhões no início da safra passada para R$ 1,9 bilhão agora. No custeio, o desembolso caiu de R$ 29,9 bilhões em julho do ano passado para R$ 17,8 bilhões no primeiro mês desta temporada. As operações de comercialização e industrialização também tiveram contratações em ritmo mais lento, para R$ 2 bilhões e R$ 1,3 bilhão, respectivamente.
Agentes financeiros relataram erros no sistema de registro das operações de crédito rural do Banco Central no período, o que teria atrasado algumas contratações. Consultado, o Banco Central não respondeu até o fechamento desta edição.
Na visão de José Carlos Vaz, consultor jurídico do agronegócio, o financiamento da safra 2024/25, principalmente o custeio, vai ganhar tração ao longo dos meses e atingir patamares históricos. O custo financeiro ainda alto para os produtores deve puxar esse desempenho. Por outro lado, o cenário de investimentos no campo está deprimido, após o “boom” observado em anos anteriores, disse ele.
“O primeiro mês do ano-safra é sempre devagar por questões de calendário agronômico, e porque as normas e sistemas ainda estão sendo atualizados. A diferença é que neste ano não tem tanta operação de investimento represada como nos anos anteriores”, afirmou. Segundo Vaz, algumas contratações podem ficar represadas por questões operacionais.
Mesmo assim, Vaz analisa que, em 2023, a cadeia do agronegócio já percebia o encolhimento das margens e percebia o crescimento da inadimplência. Agora, há uma percepção mais clara de que haverá um período de ajustamento dos fluxos de despesas e receitas, com taxas de juros altas.
“As propostas de 2024 já refletem a menor disposição de investimento por parte dos produtores e o recuo no apetite ao risco por parte dos financiadores, que já perceberam que as margens voltaram ao normal pré-pandemia”, completou Vaz.
Ivan Wedekin, ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e consultor em crédito rural, ressaltou que a situação do Rio Grande do Sul pode ter influenciado o desempenho geral na arrancada deste Plano Safra. Ele lembrou que a falta de vigência plena de regras para renegociação de débitos de produtores rurais gaúchos afetados pelas enchentes freia a contratação no Estado. A cobrança das parcelas com vencimento desde maio está suspensa até 15 de agosto.
Dados do Banco Central mostram que foram contratados R$ 3,7 bilhões pelos gaúchos em julho contra R$ 7,1 bilhões no mesmo mês de 2023. Mesmo assim, o Rio Grande do Sul lidera o ranking do crédito rural concedido nesse início de ano-safra. Na temporada 2023/24, produtores do Estado acessaram R$ 51,7 bilhões em financiamentos de custeio, investimento, comercialização e industrialização.
Os bancos públicos seguem na liderança dos desembolsos, puxados pelo Banco do Brasil, que emprestou R$ 13,3 bilhões em crédito rural em julho deste ano ante os R$ 21,6 bilhões liberados no mesmo mês de 2023.
De acordo com a instituição, o desempenho atual permitiu ampliar sua participação de mercado de crédito concedido de 48,4% para 57,3% no período comparado. Somados os outros instrumentos, como títulos do agronegócio, o BB financiou o campo com R$ 18,4 bilhões no mês passado.
No primeiro mês do novo Plano Safra, os recursos equalizados lideram os desembolsos. A poupança rural com subvenção foi a principal fonte dos empréstimos concedidos em julho deste ano, com R$ 5,6 bilhões liberados. No ano passado, essa modalidade havia alcançado R$ 3,9 bilhões em crédito concedido em julho.
Na sequência das fontes mais acessadas neste ano, aparecem os recursos obrigatórios (R$ 4,8 bilhões), que também têm juros controlados, mas não recebem equalização federal. Em terceiro lugar na lista estão os recursos livres equalizáveis (R$ 4,7 bilhões).
As Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), com taxas livres, que foram a principal fonte dos financiamentos em julho de 2023 (R$ 16,4 bilhões) e de todo o Plano Safra 2023/24 (R$ 158,9 bilhões), ficou apenas na quarta posição no mês passado, com R$ 3,4 bilhões concedidos.
Fonte: GR