
Primeiro pontífice latino-americano foi eleito por 115 cardeais após cinco rodadas de votação em março de 2013
O mundo amanheceu mais silencioso nesta segunda-feira, 21 de abril. O sino da Basílica de São Pedro soou como um lamento: o papa Francisco, o primeiro pontífice latino-americano, partiu aos 88 anos, encerrando um ciclo de 12 anos marcado por reformas, gestos de ternura e uma coragem que abalou estruturas milenares.
Era o ano de 2013 quando, em uma noite chuvosa de março, a fumaça branca cortou o céu de Roma anunciando um novo tempo. “Os cardeais foram até o fim do mundo me buscar”, disse Francisco, então Jorge Mario Bergoglio, na sacada da basílica. E de fato, veio do sul global um homem simples, jesuíta, que trocou os palácios por um quarto modesto, os sapatos vermelhos por calçados pretos, o ouro pelo crucifixo de prata.
Doente, mas presente até o fim
No último 13 de março, quando se completavam doze anos de pontificado, Francisco estava internado no 10º andar do Policlínico Gemelli. Mesmo fragilizado, recebeu o carinho dos fiéis em forma de cartazes e orações. Uma missa em ação de graças foi celebrada na capela do hospital. Dez dias depois, deixou a internação – com os olhos ainda luminosos, mas o corpo cansado.
Ainda que debilitado, acompanhou os exercícios espirituais da Quaresma pela televisão, insistiu na fisioterapia e manteve seus momentos de silêncio e contemplação. Seu coração, porém, parecia já se preparar para o adeus.
Na última sexta-feira, uma missa solene foi celebrada na Capela Paulina, no Palácio Apostólico, com diplomatas e embaixadores – como um último aceno de um papa que nunca se furtou ao diálogo com o mundo.
Revolução com humildade
Francisco foi eleito em tempos sombrios para a Igreja: escândalos financeiros, denúncias de abusos, e a surpreendente renúncia de Bento XVI. Contra esse pano de fundo, surgiu um papa com olhos voltados para os pobres, os migrantes, os esquecidos. Um pastor mais interessado em calçar as sandálias do povo do que em vestir tronos dourados.
Ele reformou a Cúria Romana, permitiu que mulheres assumissem cargos antes restritos a cardeais. Nomeou religiosas para funções de governança e escancarou janelas para que o sopro do Espírito renovasse os ares do Vaticano.
Francisco e os muros derrubados
“Quem sou eu para julgar?”, perguntou, desarmando séculos de rigidez. Acolheu divorciados, buscou compreender os jovens, abraçou os indígenas, dialogou com outras religiões. Francisco foi aquele que lavou os pés de presidiários e compartilhou refeições com moradores de rua, sinalizando que Cristo está onde há dor e compaixão.
Um diplomata entre feridas
Como Chefe de Estado, Francisco visitou 66 países. Foi ponte entre Cuba e Estados Unidos, aproximou-se de ortodoxos, estendeu a mão à China em acordos delicados. Mas também soube calar diante das dores que não tinham remédio imediato — como a guerra entre Rússia e Ucrânia, que distanciou irmãos de fé.
Guardião da Casa Comum
Seus olhos voltaram-se ainda à Terra. Na encíclica Laudato Si, clamou por justiça ecológica, denunciando a destruição do planeta como pecado contra as futuras gerações. A Igreja de Francisco era uma Igreja verde, viva, e mais humana.
O papa dos sínodos
Promoveu escuta, diálogo, convocando sínodos sobre temas urgentes como a família, a juventude e a Amazônia. Sonhava uma Igreja que caminha com o povo, e não acima dele.
O adeus ao papa do povo
Hoje, o mundo se despede do papa que quis ser chamado apenas de “bispo de Roma”. Sua partida não é só o fim de um pontificado, mas o fechamento de um capítulo vibrante e misericordioso da história eclesial.
Francisco não será lembrado apenas por suas decisões administrativas, mas por seu jeito de olhar — aquele olhar doce e firme que dizia: “Estou aqui com vocês”.
E talvez, nesse momento, em algum canto do mundo, um pobre, um migrante, uma mãe aflita ou um jovem desiludido esteja sentindo a ausência de um homem que nunca os esqueceu.
Por: Mato Grosso do Sul-Notícias